sexta-feira, 21 de fevereiro de 2014


Outra perspectiva sobre a tentação de Jesus

As tentações que os seres humanos ainda não conseguiram vencer

E Jesus, cheio do Espírito Santo, voltou do Jordão e foi levado pelo Espírito ao deserto;
E quarenta dias foi tentado pelo diabo, e naqueles dias não comeu coisa alguma; e, terminados eles, teve fome.
E disse-lhe o diabo: Se tu és o Filho de Deus, dize a esta pedra que se transforme em pão.
E Jesus lhe respondeu, dizendo: Está escrito que nem só de pão viverá o homem, mas de toda a palavra de Deus.
E o diabo, levando-o a um alto monte, mostrou-lhe num momento de tempo todos os reinos do mundo.
E disse-lhe o diabo: Dar-te-ei a ti todo este poder e a sua glória; porque a mim me foi entregue, e dou-o a quem quero.
Portanto, se tu me adorares, tudo será teu.
E Jesus, respondendo, disse-lhe: Vai-te para trás de mim, Satanás; porque está escrito: Adorarás o Senhor teu Deus, e só a ele servirás.
Levou-o também a Jerusalém, e pô-lo sobre o pináculo do templo, e disse-lhe: Se tu és o Filho de Deus, lança-te daqui abaixo;
Porque está escrito: Mandará aos seus anjos, acerca de ti, que te guardem,
E que te sustenham nas mãos, Para que nunca tropeces com o teu pé em alguma pedra.
E Jesus, respondendo, disse-lhe: Dito está: Não tentarás ao Senhor teu Deus.
E, acabando o diabo toda a tentação, ausentou-se dele por algum tempo.
Lucas 4:1-13

Já preguei, ensinei e escrevi várias vezes nos últimos 18 anos sobre o texto da tentação que passou Jesus nos quarenta dias que esteve no deserto. Convém dizer de início que o primeiro versículo já nos coloca em perspectiva qual é a única maneira de passar por esta circunstância e vencê-la adequadamente: estar cheio do Espirito Santo. É neste Espírito que o Senhor Jesus, como homem, nos fornece a chave de como vencer as tentações.

Estar cheio do Espírito Santo é muito mais do que experimentar algumas das facetas espirituais pentecostais atuais, com gritos, rodopios e profecias aleatórias de cunho geral sobre a vida dos frequentadores deste tipo de culto. Ser cheio do Espirito Santo é também ir além dos “caixotes” teológicos não-espirituais que encontramos nos meios mais tradicionais com a capa e a forma superficial de doutrina cristã reformada ou afins.

Ser cheio do Espírito é tomar o exemplo de Jesus, que recebeu a presença do Espírito Santo de forma inequívoca e, ao mesmo tempo, foi capacitado para inclusive, enfrentar as mais difíceis provações, mas ao final delas, manifestou o poder real do Espírito nas vidas das pessoas que o cercavam, revelando as Escrituras, curando-os e libertando-os (a narrativa vai até o final do capítulo).

Quero apresentar nos próximos parágrafos outra abordagem sobre o texto e procurar mostrar as tentações por outros caminhos que ainda não tentei. Chamei essa minha nova aproximação da narrativa de Lucas de “Tentações ainda não vencidas pelos seres humanos” por um simples motivo: embora Jesus as tenha vencido magistralmente e nos dado as armas espirituais para vencê-las também, o contrário disso é o que mais temos visto na história humana geral.

Primeira tentação ainda não vencida:
A tentação de mudar a natureza das coisas. Satanás mostra uma pedra a Jesus e diz para ele transformá-la em pão, visto que sabe que o Senhor está com fome. Jesus e Satanás sabem que o poder de transformas a matéria é de prerrogativa do Criador, o próprio Cristo vai demonstrar essa poder no casamento em Caná, transformando a água em vinho, mas aquele não é o momento para isso. Jesus recusa fazê-lo e profere que a Palavra de Deus também serve de alimento ao homem, mesmo quando este não tem a perspectiva da satisfação imediata de seu desejo básico, como o de se alimentar.

Mesmo tendo o poder de fazer com que as pedras se transformem em pães Jesus não o usa, pois sabe que essa estratégia de facilitar as coisas ou de mudar a natureza delas é própria dos conselhos do maligno desde o Éden. Lá ele já havia desafiado Eva a aceitar o fato de que se comesse a fruta da escolha, ela e o marido teriam sua natureza alterada para a divina, conhecendo como Deus, o bem e o mal. É isso que subjaz a artimanha do inimigo, a tentativa de nos convencer que podemos alterar a natureza de tudo, mesmo a das inalteráveis.

Quero dizer com isso, que muitas vezes somos convencidos que por conta dos novos tempos, devemos mudar o enfoque de nossa pregação para ser mais aceitáveis à nossa geração. Que não é preciso mencionar as verdades mais duras do evangelho, como a realidade do inferno e do julgamento final, para que atraiamos mais pessoas ao culto. Que é necessário suprir as demandas do povo pecador para mantê-los na igreja a qualquer custo, mesmo que custe a sã doutrina ou a santidade.

Do outro lado, o ser humano tenta constantemente mudar a natureza das coisas, sem perceber os prejuízos morais, sociais e espirituais que isso traz. Tentam mudar os princípios da família para caber em suas novas formas mais liberais de relacionamentos. Tentam mostrar que a homoafetividade é coisa natural e todos os tipos de práticas sexuais são igualmente aceitáveis desde que sejam cobertos ou abrangidos por sua definição de “amor”. Tentam mudar os conceitos de verdade, ética e moral para que se ajustem à sua maneira de viver sem Deus.

Segunda tentação ainda não vencida:
A tentação de controlar e manipular as pessoas. O Diabo mostra os reinos do mundo e sua glória e oferece a oportunidade de governá-los e controlá-los pela bagatela de Jesus “simplesmente” se ajoelhar e adorar a ele. Em minha frágil opinião, acredito que esta tentação em relação a Jesus foi muito fraca e ridícula por parte do inimigo, mas ele não deixou de tentar. Porque digo isto? Porque Jesus é o Verbo de Deus, e como participante do momentum criativo, nada no universo o faz aspirar de desejo, pois Ele criou todas as coisas. Foi meio infantil de Satanás essa tentação.

Mas em relação aos humanos, a coisa muda drasticamente. Desde que o homem passou a viver em comunidade ele tenta se sobressair aos outros e poucos tentam controlar muitos. Da primeira cidade construída até as civilizações mais avançadas atualmente os seres humanos desejam o controle sobre os outros. Foi assim com os sumérios, egípcios, babilônicos, medos, persas, gregos, romanos, com o catolicismo medieval e com as nações da primeira e da segunda guerra mundial. Desde a queda o homem deseja controlar o próximo.

É assim hoje com os chamados “formadores de opiniões”, mais vazios que seus seguidores; com os “ídolos” dos esportes, da música, da TV e do cinema, que salvo as raras exceções, também são um mix de “nada com nenhuma coisa”; é assim na Academia, onde alguns reprodutores e repetidores de conceitos inexpressivos de outros se arrogam superiores aos “alunos” que nada sabem e só conhecem o “senso comum”. Infelizmente é assim na igreja, onde alguns que conseguiram ascender entre os demais se consideram os maiorais entre nós. A humildade do Carpinteiro e do Cordeiro foi esmagada pelos pés destes “grandes homens de Deus”.

Esta é uma tentação que para os seres humanos é tão difícil quanto as outras. É claro que o mundo, as organizações necessitam de líderes e as organizações religiosas precisam de sacerdotes. Porém, o caso aqui não é uma questão de liderança corporativa ou espiritual, mas de usurpadores desse poder e lugar legítimos com o agravante de prejudicar ou destruir a vida de muitos outros que se colocam ou foram postos debaixo dessas influências. O perigo é o de transformar a liderança que deveria benéfica e libertadora em uma ditadura pessoal e manipuladora.

A terceira tentação não vencida:
A tentação de usar a fé e a religião para desejos egoístas. Satanás leva Jesus à parte mais alta do Templo, e para mim isso é muito sugestivo. De lá, ele cita um texto bíblico do Salmo 91 isolado de todo o seu contexto de amor e obediência a Deus, e o incita a pular para que o texto se cumpra na íntegra. É impressionante a maneira como o Diabo faz esta última tentativa. Ele sabe que Jesus é o Filho de Deus, sabe que Jesus crê literalmente na Palavra de Deus, pois ele mesmo é a expressão viva dela, e Satanás a usa contra o próprio Cristo, sem titubear.

A questão aqui está em torno do Templo, portanto do lugar de culto a Deus naquela época, de seus costumes religiosos e de como a relação da pessoa com a adoração a Deus está diretamente conectada com o tipo de vida que ela leva. Ao mesmo tempo, está relacionada com a fé pessoal daquele que resolveu crer em Deus e em sua Palavra e de como essa fé pode ou não trazer resultados por aquilo que a Palavra expressa como sendo a verdade de Deus.

Isto significa que no âmbito religioso – e isso é particularmente para os seres humanos que se relacionam com a religião – a tentação se apresenta como a maneira que lidamos com a fé e com os nossos desejos pessoais. Isto tem desdobramentos sérios, pois se não controlarmos os nossos desejos egoístas, poderemos, por causa deles, tentar criar alternativas não aceitáveis a Deus, não éticas e morais para Jesus, mas que façam com que alcancemos os nossos objetivos pessoais a qualquer preço.

Devo dizer que a fé é poderosa, que a fé que vem de Deus remove montanhas e árvores do lugar, que liberta as pessoas das possessões, que cura as enfermidades mais graves, que ela nos faz prósperos na vida pela obediência aos princípios divinos e que ao final, nos levará à eternidade com Ele (como diz nas Escrituras). Todavia, a fé usada no ambiente de culto com finalidades egoístas e com objetivos ocultos de manipulação e engano contra aqueles que creem é de origem satânica. E por isso deve ser exorcizada de nosso meio.

Finalizo dizendo como comecei que, sem o Espirito Santo vivendo realmente em nós, nos capacitando diariamente para enfrentarmos as tentações e nos alimentando do seu fruto que nos transforma na imagem do Filho de Deus, Jesus, certamente iremos afundar nas areias movediças das tentações ainda não vencidas pelos homens e mulheres que insistem em viver sem Deus.

Soli Deo gloria!

© Carlos Carvalho

Teólogo e Pr. Sênior da Comunidade Batista Bíblica

segunda-feira, 3 de fevereiro de 2014

Iguais, mas diferentes
Homens e Mulheres – iguais na criação, diferentes na função.

Sem pretender agravar ou acumular volumes nas discussões sobre feminismo e machismo, patriarcado ou matriarcado, quero ater-me circunstancialmente ao tema específico das diferenças funcionais entre os homens e as mulheres, sem, contudo, deixar de expor que creio firmemente na igualdade criacional de ambos, ou seja, o homem e a mulher foram feitos do mesmo material, igualmente criados por Deus (falo na perspectiva teológica) como interdependentes e com o mesmo grau de importância ante o mundo criado. Sem os dois não haveria humanidade, família ou sociedade.

No âmbito natural é clara e óbvia as diferenças inquestionáveis entre os dois. Da mesma maneira que em um homem não se pode colocar um útero, um óvulo ou desenvolver uma gestação, tampouco se cria leite materno em seu peito, isso é função natural da mulher e ninguém inteligente ousaria por em xeque essas observações tão básicas. Ao mesmo tempo a mulher não nasce com órgão genital de homem (somente os raros casos de hermafroditismo, sendo uma falha genética corrigida posteriormente), seus genes são diferentes e seu cérebro processa a linguagem e a emoção de forma diferenciada do homem.

Também podemos com elevado índice de certeza afirmar que o ambiente em que vivemos, a cultura na qual estamos inseridos e as relações entre os indivíduos contribuem significativamente para patentear as diferenças entre os homens e as mulheres. Dependendo do país ou da região, a cultura vai formar os papéis, as funções e regular as relações entre os dois sexos. Portanto, ao levar em consideração a força do ambiente sociocultural, somado às heranças genéticas de diferenciação, é fácil perceber que essas diferenças estão bem definidas e claramente expostas em qualquer sociedade no planeta, independente da época que analisemos.

No contexto teológico, histórico e espiritual das narrativas bíblicas é possível ver, mesmo em épocas onde as mulheres não possuíam certos direitos sociais, que elas aparecem e têm participações importantes na história do povo de Deus e mesmo nas nações, como nos casos de Débora e Ester, que vão além das funções maternais e do lar que era esperado naquelas sociedades. As mulheres da Bíblia são essenciais para a história que ela se propõe a narrar de Gênesis a Apocalipse. As mulheres são vitais para que o cumprimento dos planos de Deus se realize no mundo, na nação e na vida dos homens.

Aqui podemos chegar à proposta do título deste artigo: iguais, mas diferentes. Os homens são iguais às mulheres no que diz respeito à criação (ambos foram diretamente formados por Deus), no que tange à responsabilidade mútua de dominar sobre o planeta e sobre os animais, no cuidado com a família (casamento e filhos), na inteligência com a qual podem desenvolver suas profissões e carreiras, na ocupação corporativa, onde ambos podem estar ou ascender a qualquer posto no ambiente de trabalho, são iguais no devido respeito às dignidades essenciais de seres humanos que qualquer um é merecedor e são iguais nos direitos constitucionais nos países livres.

Todavia, as mulheres não são iguais aos homens em dois aspectos teológicos principais (pois os aspectos naturais já foram contemplados): no governo e na autoridade. Preciso explicar isso. Como governo estou me referindo ao investimento oficial ou comissionamento autorizado para governar legitimamente uma nação ou um povo. Teologicamente nas Escrituras é impossível verificar que uma mulher foi investida de governo ou autorizada a exercer a função de sacerdote ou de dirigente de uma nação. É a esse respeito que falo. Mesmo que em países democráticos uma mulher possa assumir a posição de chefe de Estado, isso não deveria ser uma posição ocupada por ela, independente do que alguns possam pensar (para que não se assustem comigo, votei na Marina nas últimas eleições presidenciais).

No quesito autoridade também devo me explicar. A autoridade à qual me refiro é aquela que indica a posição de “cabeça” do lar e de ocupar uma posição espiritual acima do homem. De novo, teologicamente nas Escrituras, não cabe à mulher o papel de ser a pessoa que governa o homem no lar ou que na instituição religiosa esteja acima do homem. Não é dado à mulher esse particular privilégio. Quero fazer ressalva à palavra submissão, pois esta não é compreendida por muitos, mesmo no ambiente religioso. Submissão não se trata de escravidão à vontade do outro, nem somente de seu aspecto de estar debaixo das leis ou da autoridade de outrem.

Mesmo que estes sejam os aspectos mais conhecidos e disseminados nos dicionários e em conceito, não se pode esquecer que há outra nuance na submissão que compreende o ato consciente e voluntário de ceder espaço ao outro. Digo isso porque não podemos ser simplórios ao imaginar que toda e qualquer pessoa que se submete à outra o faz por medo ou por ato de subserviência obrigatória. Isto é particularmente importante no ambiente religioso saudável. Muitas das pessoas que participam da membresia das igrejas cristãs no mundo são pessoas inteligentes, estudantes, formadas, muitas são empresárias ou empreendedoras, executivos, profissionais liberais, professores de todos os níveis, comerciantes, engenheiros, cientistas, artistas, militares e etc. É impossível enganar um contingente tão grande de pensadores ou de críticos e mantê-los sob o jugo da “submissão” sem que essas pessoas se “rebelem” contra um sistema arbitrário e opressor. Nestes casos está em operação a última definição de submissão: eles cedem conscientemente espaço para serem guiados pelas autoridades que eles mesmos escolheram sobre si.

Retornando às mulheres, acredito firmemente que elas têm mais vantagens naturais que os homens em diversos aspectos, mas isso não justifica que elas se julguem superiores ou melhores e nem que tomem as posições de governo e autoridade destinadas aos homens. Sei que em muitos casos isto acontece porque nas últimas décadas os homens deixaram de cumprir o seu papel de liderança do lar e da sociedade, mas paralelo a isso, as mulheres precisam permitir duas coisas básicas aos homens: 1) que eles retornem ao seu papel fundamental na criação de governarem seus lares e a sociedade e 2) que elas exerçam conscientemente a submissão como defini, ceder espaço para que esses homens possam ser as pessoas que estão destinadas a ser.

As mulheres não são diminuídas por isso, não é machismo chauvinista, não é ataque contra as bases feministas e aos seus direitos adquiridos no mundo livre, mas um retorno às bases fundamentais da sociedade humana e dos princípios que trouxeram parcela significativa do desenvolvimento das nações até aqui.  Homens e mulheres são iguais, mas diferentes. Iguais na criação, mas diferentes na função.

Quero, porém, que entendam que o cabeça de todo homem é Cristo, e o cabeça da mulher é o homem, e o cabeça de Cristo é Deus.
Pois o homem não se originou da mulher, mas a mulher do homem;
além disso, o homem não foi criado por causa da mulher, mas a mulher por causa do homem.
No Senhor, todavia, a mulher não é independente do homem, nem o homem independente da mulher.
Pois, assim como a mulher proveio do homem, também o homem nasce da mulher. Mas tudo provém de Deus.
1 Coríntios 11:3-12 (NVI)


Carlos Carvalho
31 de janeiro de 2014

Referências:
Diferenças entre homens e mulheres: biologia ou cultura? Charbel Niño El-Hani. Disponível em: http://www.usp.br/revistausp/29/22-charbel.pdf
Existem diferenças cerebrais entre os homens e as mulheres? Prof. Dr. Renato M.E. Sabbatini. Disponível em: http://www.cerebromente.org.br/n11/mente/eisntein/cerebro-homens-p.html
Mulheres Inteligentes. Samuel Procópio/ Adélia Francisca da Silva. Publicação independente. São Luiz do Maranhão: 2010. Capítulo 4, p.47ss.