A DÁDIVA DA VIDA ETERNA
Lucas 18.18-30
Este é aquele
famoso texto onde Jesus conversa com o moço rico que queria saber o que deveria
fazer para herdar a vida eterna. O que está em evidência é a vida eterna, ou
seja, a garantia da vida após a morte e a certeza que esta se dará ao lado de
Deus e não no inferno ou na condenação eterna. as palavras originais que são
traduzidas como vida eterna por si só já demonstram que é a vida vindoura e não
a vida vivida aqui.
Se tomarmos um
quadro geral como expressão dessa perícope selecionada do capítulo dezoito,
veremos que toda a conversa e as nuances que se desenvolvem a partir dela se
concentram na questão da vida porvir. O versículo 18 e o versículo 30 iniciam e
terminam o texto com a vida eterna como tema central. O moço faz uma pergunta
sobre ela e Jesus finaliza a conversa dando a perspectiva correta sobre a
mesma.
O jovem vê a
vida eterna na perspectiva da legalidade e de sua relação com a Lei de Deus.
Ele está acostumado com essa visão legalista e da justiça que os homens de
Israel tentavam alcançar pelo cumprimento integral dos mandamentos – embora
nenhum ser humano conseguiu – e, a partir dessa relação, pensa que o assunto
que possivelmente lhe angustia, está centrado nas mesmas bases legais que sua
própria sociedade culturalmente vivia.
Ao percebermos
o início da conversa e como Jesus lhe questiona sobre o seu relacionamento com
a Lei, depois de o jovem ter indagado o Senhor sobre como ele poderia “herdar”
a vida eterna, logo vemos que sua perspectiva sobre o futuro estava fundada nos
mesmos princípios legais que geriam as questões das heranças entre o povo
.
Ele entendia perfeitamente o princípio de herança que era uma questão legal da
sociedade, mas equivocadamente pensava que a vida eterna seria uma coisa de
“direito” ou de “legalidade”.
Por isso Jesus
passa a descrever em outros termos o que é a vida eterna em sua perfeita ótica,
na tentativa de alterar a perspectiva do jovem sobre o assunto. Deste ponto em
diante, veremos por outras vias, a verdade ensinada pelo Senhor sobre a vida
eterna. Podemos compreendê-la de quatro maneiras:
Primeira – a vida eterna é o reconhecimento de que a pessoa não tem o
que realmente necessita para possuí-la (veja v.22,23).
Aquele moço
possuía tudo o que qualquer pessoa na face da terra compreende como as coisas
mais excelentes que o dinheiro e a posição podem comprar ou ter, porém, mesmo
assim, Jesus diz a ele que lhe falta algo. Certamente para o moço a única coisa
que lhe faltava era a garantia de viver para sempre, mas o Senhor lhe assevera
que ele não tem o que realmente precisa para ganhar a eternidade.
Com estas
palavras Jesus lhe diz que a vida eterna só pode ser alcançada por pessoas que
sabem que são profundamente necessitadas. Quando o Senhor lhe fala que ele só compreenderá
a vida eterna quando se desfizer de tudo o que tem e passar a viver na total
dependência dele, o jovem começa a perceber que a vida eterna não é um assunto
para gente imatura e sem bom senso, mas para pessoas que estão dispostas a ir
muito além do comum.
Segunda – a vida eterna não pode ser conquistada pelos recursos
pessoais (veja v.24,25).
Jesus faz uma
fortíssima declaração após ver a profunda tristeza de semblante que tomou conta
do jovem rico quando percebeu que a vida eterna estava distante dele. Ele disse
que um rico não pode entrar no reino dos céus, ou seja, receber a vida eterna,
pelo simples fato de que suas riquezas lhe impedirão de alcançar esta vida
porque elas se tornarão a única vida com a qual essa pessoa passará a
reconhecer e viver e da qual dependerá.
Claro que à
luz das Escrituras
sabemos que o Senhor não está vaticinando que nenhum rico vai para o céu e só
os pobres têm lugar lá, mas que qualquer pessoa que põe sua confiança no
dinheiro ou nas riquezas não irá possuir a vida eterna, porque as riquezas
serão o próprio “deus” da pessoa e esta irá servi-lo sem perceber que se tornou
escravo de um sistema que tem sua própria autonomia e independência de Deus.
Mamon
é o seu deus e sua vida.
Terceira – a vida eterna é uma impossibilidade humana (veja v. 26,27)
Os discípulos
ouvindo as declarações de Jesus logo pasmaram com o grau de seriedade e
indagaram que, sendo esses os termos, quem poderia ser salvo? O Senhor responde
que a salvação, neste caso, a vida eterna, não é uma coisa que os seres humanos
podem alcançar por conta própria, por esforços próprios ou por seus recursos
pessoais, mas é algo que apenas Deus pode conceder, ou seja, é um presente, uma
dádiva, um dom. a vida eterna é concedida por graça, pela graça, não é uma
conquista ou direito humano.
Jesus
demonstrou claramente por suas palavras que a vida eterna não é “herança” de
direito humana, que ela não pode ser adquirida por nenhuma riqueza material,
por nenhum preço que se possa estipular pelos processos de valoração desta
existência, mas que a vida que ultrapassa o nosso próprio tempo cronológico e
biológico de vida está para além de nossas vontades e desejos, e apenas podendo
ser concedida por favor divino em sua soberania.
Quarta – a vida eterna está fundamentada na renúncia (veja v.29,30)
Jesus encerra
sua fala respondendo não mais à pergunta do jovem rico – que à essa altura já
não participava mis da conversa – mas aos discípulos que também introduziram
questionamentos sobre a impossibilidade da salvação, e que pela segunda vez interrogaram
Jesus dizendo que se eles mesmos haviam deixado tudo para segui-lo, qual seria
a sua recompensa? O Senhor os responde com uma de suas máximas mais
contundentes: que a renúncia é o preço para se viver uma vida abençoada aqui e
no porvir.
Os discípulos
precisavam compreender que a renúncia a tudo o que nos é mais importante, seja
família, casa ou bens, é o fator decisivo e definitivo do seguir e do andar com
Deus. Seguir a Jesus implicaria em abrir mão de tudo, tudo mesmo para depois
receber de volta tudo o que renunciou em medida multiplicada. Esse é o segredo
da vida com Jesus: renunciamos a tudo, entregamos tudo a ele, e agora, sendo
dono de tudo, ele nos faz mordomos daquilo que é seu. É como se Cristo nos
disseste: “Tudo que você tem é meu, agora eu te dou o que é meu para que você
cuide para mim por um certo período de tempo!”
Somos apenas
mordomos dos bens de Deus. Tudo que temos ou viermos a ter, nossa casa ou
casas, nossa família, nosso trabalho, nossos bens e dinheiro, já não são mais
nossos, são dele. E ele por infinita misericórdia e graça nos ofereceu a honra
de cuidar de todas essas coisas até o dia de sua volta ou de nossa morte. Aos
mordomos espera-se que somente sejam fiéis administradores dos bens de seu Amo
e Dono, o Senhor.
Queremos ouvir
naquele dia: “Muito bem, servo bom e fiel. Sobre o pouco foste fiel sobre muito
te colocarei; entra no gozo do teu senhor” (Mateus 25.21). Ansiamos de Deus em
Cristo Jesus a vida eterna!
Bp. Carlos Carvalho
Teólogo, Cientista Social, Pr.
Sênior da Comunidade Batista Bíblica e fundador da ONG ABAN Brasil.