Esta é uma palavra bem conhecida
na Escritura Sagrada. Em linhas gerais, com suas variantes, ela aparece mais de
120 vezes nos dois Testamentos. Desde o livro do Gênesis quando o Senhor diz a
Adão e Eva para que não tomem do fruto proibido e o casal lhe desobedece até Deus
ordenar a Abraão que deixe sua terra e seus parentes para peregrinar em lugares
que ele antes não tinha ido ou quando Abraão vai sacrificar seu próprio filho
ao Senhor para demonstrar o extremo de sua obediência a Ele, vemos a obediência
implícita e explícita nas páginas do livro.
Desde que o Senhor envia Moisés
ao Egito como libertador de seu povo e o conduz ao deserto e os prova ali por
tantos anos – precisamente por causa da sua resistência a obedecer aos
mandamentos dele – até depois de estabelecidos na terra de Canaã, Deus lidou com
a desobediência deles por causa de sua imoralidade, rejeição aos comandos de
Deus para que não se misturassem com os povos pagãos e nem adorassem seus
deuses e ídolos e causando finalmente a expulsão de Israel da terra prometida,
vemos em tudo isso a obediência ou a desobediência como o centro das atenções.
No Novo Testamento, esta palavra
aparece 48 vezes, portanto, quase metade das vezes de toda a Escritura. A
obediência vem com uma série de significados e implicações:
A.
Em Jesus, a palavra assume a perspectiva de que
os que creem nele devem “cumprir” ou “praticar”, que significa o mesmo que
obedecer, as suas palavras (Mateus 7.24-27). Portanto, nos quatro Evangelhos, a
obediência em relação a Jesus está relacionada com a ordem de praticar o que
ele ensinou (veja Mateus 28.19,20 e João 15.14).
B.
Em Atos dos apóstolos a obediência tem quatro sentidos.
Os apóstolos dizem que vão obedecer a Deus mesmo quando o Sinédrio tenta
impedi-los de pregar a mensagem de Cristo (At.5.29); o Espírito Santo só está
na vida daqueles que obedecem a Deus (At.5.32); muitos sacerdotes obedeciam a
fé em Cristo (At.6.7); e Paulo até mesmo diz que não foi desobediente a uma
visão espiritual eu recebeu (At.26.19).
C.
Nas epístolas, a obediência tem vários
significados:
Em aos
romanos, a obediência está conectada à luta contra o pecado. Ou se obedece ao
pecado ou se obedece à justiça (Rom.2.8 e 6.12,16,17) e com a obediência da fé
(Rom.10.16 e 15.18).
Em aos
coríntios, Paulo estabelece os limites da vida cristã em várias áreas (1
Cor.10.23, por exemplo); faz menção da obediência dos crentes de corinto (2
Cor.2.9 e 7); e ensina que a finalidade da batalha espiritual é a obediência
das mentes conquistadas a Cristo (2 Cor.10.3-6).
Em gálatas, a
questão está na desobediência dos crentes ao evangelho de Cristo quando eles
aceitaram obedecer a certos ritos da Lei, a exemplo da circuncisão, como
garantia da salvação. Eles são repreendidos por não obedecerem à verdade de
Cristo Jesus (Gál.5.7).
Em efésios, a
obediência assume um caráter bem mais prático nas relações humanas, como a
relação dos pais e filhos (Ef.6.1) e de patrão e empregado (Ef.6.5).
Em filipenses,
o apóstolo descreve o nível de obediência sacrificial de Jesus (Fil.2.8),
assim, os crentes devem desenvolver a salvação na obediência prestada ao que
lhes foi ensinado (Fil.2.12).
Em
colossenses, a questão retorna ao nível mais prático dos relacionamentos
(Col.3.20,22).
Em
tessalonicenses, a desobediência ao evangelho será julgada (2Tes.1.8) e que a
igreja deve notar os que não obedecem às palavras dos apóstolos (2Tes.3.14,15).
Em Tito, os
crentes devem ser ensinados a obedecerem as autoridades (Tit.3.1), que é um eco
de Romanos 13.
Em hebreus, o
autor descreve as consequências da obediência de Cristo a todos os que lhe
obedecem (Hb.5.8,9); fala da obediência de Abraão (Hb.11.8) e da obediência aos
pastores humanos (Hb.13.17)
.
Em Tiago o
foco é a prática da palavra de Deus (Tg.1.19-25) e da relação dos crentes com a
Lei moral de Deus (Tg.2.8-13).
Pedro também
dá ênfase a uma obediência mais prática que os crentes devem observar (veja,
1Pe.1.2,14 e 3.1,6).
Judas é uma
carta que proclama quase que totalmente contra as formas de desobediência dos
falsos cristãos e falsos líderes do povo de Deus (v.5-23).
E Apocalipse
sinaliza o fim dos que não obedecem a Palavra de Deus nem se santificaram nesta
obediência (Ap.21.8 e 22.15).
Por isto é que
não podemos tratar a questão da obediência/desobediência como sendo algo de
foro íntimo na vida dos cristãos ou somente como coisa de escolha pessoal, pois
toda obediência será recompensada e toda desobediência será castigada ao final
da história. Quando o profeta Samuel repreendeu o rei Saul por sua
desobediência, aquilo não se constituiu apenas como o registro histórico da
rejeição de Deus a um rei rebelde, mas a Escritura ali estabeleceu um princípio
para além do contexto, que serve a qualquer tempo e a qualquer pessoa. O
próprio Jesus se referiu ao princípio em outra ocasião totalmente diferente (leia
Mateus 9.13).
Samuel, porém, respondeu: Acaso
tem o Senhor tanto prazer em holocaustos e em sacrifícios quanto em que se
obedeça à sua palavra? A obediência é melhor do que o sacrifício, e a submissão
é melhor do que a gordura de carneiros.
Pois a rebeldia é como o pecado da
feitiçaria, e a arrogância como o mal da idolatria. Assim como você rejeitou a
palavra do Senhor, ele o rejeitou como rei.
1 Samuel 15.22,23
Diferentemente do que alguns
cristãos e cristãs pensam, a maioria dos pastores e líderes evangélicos – no sentido
mais pleno da palavra – não os guiam debaixo de submissão cega ou exigindo
obediência irracional (exceções existem, mas são facilmente percebidas). É
igualmente importante saber que por mais livre que alguém seja em Cristo, isto
não é sinal nem autorização para se agir em insurreição, rebeldia ou para a
destruição dos fundamentos da harmonia do corpo de Cristo ou da comunidade de
fé local a qual pertence.
Em Cristo.
Bp. Carlos Carvalho
Teólogo e Cientista Social
Comunidade Batista Bíblica
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