PASSIVIDADE CRISTÃ
Tenham cuidado, pois os homens os
entregarão aos tribunais e os açoitarão nas sinagogas deles.
Por minha causa vocês serão
levados à presença de governadores e reis como testemunhas a eles e aos
gentios.
Mas quando os prenderem, não se
preocupem quanto ao que dizer, ou como dizer. Naquela hora lhes será dado o que
dizer, pois não serão vocês que estarão falando, mas o Espírito do Pai de vocês
falará por intermédio de vocês.
Mateus 10:17-20
Vivemos numa época em que os
temas de ordem são a tolerância mais ampla, principalmente a religiosa, os
direitos humanos mais plenos, principalmente na aceitação de comportamentos
sexuais que antes eram tidos como imorais, e a igualdade social, onde a
distribuição de renda é a principal ação para equilibrar o enorme abismo entre
os que mais têm e os que menos têm, sem, contudo, criar mecanismos de avanços
pessoais para os auxiliados. Todavia, todas essas agendas são reais,
necessárias em muitos níveis e precisam ser implementadas dentro da lei, do bom
senso e da ética.
Os cristãos evangélicos[1]
em sua grande maioria são os que mais têm problemas conceituais nas situações
apresentadas acima, isto porque há uma clara divisão entre nós acerca da
maneira como devemos agir em relação a elas: ou nos calamos e vivemos nossas
vidas tranquilamente achando que nada nos atingirá ao longo do tempo, ou nos
levantamos e pelos mecanismos sociais e políticos que dispomos tentando mudar o
rumo das coisas. No fundo, como diz o profeta Elias[2],
estamos “coxeando entre dois pensamentos”
.
É preciso contextualizar
urgentemente a época na qual vivemos para compreender a nossa maneira de agir.
Quando os apóstolos e discípulos dos primeiros três séculos viviam, eles
estavam debaixo de um império onde apenas o desejo de um monarca seria
suficiente para que fossem mortos das maneiras mais brutais. Nos demais séculos
até que viesse a Reforma, o Iluminismo e a Revolução Industrial, os cristãos
estavam submissos ao Catolicismo e aos reis, príncipes e dominadores, sob os
quais também não possuíam direitos assegurados em sua liberdade[3].
Também é preciso levar em
consideração outras duas situações atuais. Não vivemos em países ou regiões
controladas por religiosos fundamentalistas onde ser cristão ainda é
considerado um crime punível com a morte, nem habitamos em países autoritários
e não democráticos, onde os cristãos vivem sem direitos de culto e com a
possibilidade de perderem seus bens ou de serem presos. Vivemos em países
livres ou moderadamente democráticos com direitos assegurados por Carta Magna e
por leis que garantem nossa segurança.
Aqui chegamos ao ponto nevrálgico
do que queremos nos fazer compreender. Em países como os nossos, a batalha
pelos direitos e pela paz social – no que diz respeito aos cristãos – não se dá
somente no campo espiritual de guerra contra as forças espirituais da maldade[4]
que atuam para destruir os seres humanos, mas também nos campos político e da
legislação, na criação das leis que regem nossa sociedade[5].
É precisamente nestes dois últimos lugares que os evangélicos têm ficado
confusos, ou seja, os crentes ainda não sabem o papel da igreja e do
Cristianismo nestas áreas. Porém, isto só é visto entre os cristãos mais
recentes, pois os do século XX para trás sabiam o que fazer.
Há um claro movimento político e
legislativo com os discursos legítimos de tolerância, dos direitos humanos e da
igualdade social, mas que tem uma agenda concreta de fazer calar o
Cristianismo, em alguns casos de acabar de vez com a força de nossa crença. Há
movimentos acadêmicos, até em faculdades e universidades de confissão de fé
cristãs onde a fé nas declarações sobrenaturais da Escritura, as narrativas
bíblicas e a própria Escritura são relativizadas, mitologizadas e
desacreditadas. Além de um bom número de movimentos chamados sociais que têm um
claro viés totalitário, comunista e socialista, nos quais o Cristianismo não
goza de aceitação.
Portanto, Cristianismo, cristãos
evangélicos e protestantes não podem aceitar passivamente o calar de suas vozes
em nome de agendas politicamente corretas ou legítimas, mas que inequivocamente
possuem intenções não ocultas de destruir a nossa fé, e para ser menos grave,
de no melhor das opções, nos transformar em passivos observadores, meramente
igualados num grande “ecumenismo religioso” e social no qual aceitamos que a
verdade que acreditamos e pregamos é apenas um pedaço do grande mosaico da
“verdade maior”, ou seja, da grande mentira religiosa gerada pela antiga
serpente lá no Édem[6].
Deus nos deu as armas para o
combate excelente em todos os níveis que este se nos apresente, quer no campo
espiritual, quer no campo da verdade, seja no campo político e da legislação ou
no campo religioso. Não podemos ser passivos e tampouco nos calar na
proclamação da mensagem da fé e da verdade, mesmo que desagrade a quem quer que
seja, políticos, movimentos sociais ou religiosos. Nosso papel é maior do que
alguns querem nos fazer acreditar, mesmo sabendo que o mundo continuará
deteriorando-se moralmente até o retorno de Cristo[7].
“...o
cristianismo é uma religião de luta.”
C.
S. Lewis
Cristianismo
Puro e Simples
Carlos Kleber Carvalho
Teólogo, Cientista Social, e Bispo da Igreja da Cidade - CBB.
Guarulhos, SP.
Notas:
[1] Me refiro a esse termo
para inserir todos os crentes protestantes e não católicos, mas não tenho por
ele apreço pela forma como é banalizado em nossos dias.
[2]1
Reis 18:21.
[3] Não estou fazendo juízos
de valor sobre estes temas. Houve os pontos positivos e negativos deles, mas
não há espaço para essa discussão aqui.
[4] Aos efésios 6:12.
[5]1
Timóteo 2:1-2.
[6]No livro do Gênesis,
capítulo 3, a serpente consegue enganar a primeira mulher relativizando e
alterando o sentido das palavras ditas por Deus e lhe sugerindo o conhecimento
de uma “verdade” que, segundo ela, Deus estava ocultando do ser humano. O
resultado foi a morte espiritual e física dos descendentes de Adão.
[7]
Mateus 24:12
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