quarta-feira, 10 de julho de 2013

Deus e o Mundo Mal
Salmo 9.10
“Em ti, pois, confiam os que conhecem o teu nome, porque tu, Senhor, não desamparas os que te buscam.”

Pode apenas parecer que este seja um assunto fácil de tratar, mas não é. Todos os que de alguma maneira questionam a existência de Deus usam argumentos de que se Deus existisse de fato, muitas das coisas ruins do mundo não aconteceriam ou o mal não teria a forma destrutiva que tem aos nossos olhos, porque, se Deus é bom, como o mal parece prevalecer neste mundo criado pelo bom Deus?
Da mesma forma, eles intencionalmente se esquecem de que a maldade do homem e suas consequências são originadas no próprio ser humano e não em Deus. A noção sociológica defendida por alguns de que o homem nasce essencialmente bom e é desvirtuado pelo meio onde vive[1], não encontra respaldo nas Escrituras, que asseveram a maldade intrínseca no homem desde o nascimento após a queda[2].
Portanto, temos um dilema: como conciliar as duas faces da moeda? Um Deus bom, criador do homem e do mundo, com um homem mal, gerador de um mundo mal? Aqui reside toda a virtude da questão. O fato de Deus ser quem é não anula o que o homem é, nem tampouco anula as consequências dos atos dos homens sobre os homens. Não é o caso que Deus se ausentou[3], como afirmam outros, mas um caso de responsabilização pelos atos.
Jamais aceitaríamos o fato de alguém não ser punido pelos crimes que cometeu, nunca acharíamos normal uma pessoa não ser penalizada por uma infração de trânsito, não concordaríamos com a liberdade de um criminoso de guerra, não receberíamos como normal e “acidental” a morte de alguém causada por imperícia médica. Os casos se multiplicariam a números absurdos se continuasse neste pensamento, não?
Pelo simples fato de que Deus responsabiliza o homem pelos seus atos contra o seu semelhante é que não vemos Ele agindo como um fictício juiz daqueles filmes futuristas em que essa pessoa assume todas as credenciais de juiz, júri e executor da pena sobre os criminosos[4]. Porque Deus não faz assim e permite que o homem puna e penalize o próprio homem, não podemos inferir que Ele não se importa ou não está interessado em nós.
Agora, passo à parte do Salmo que chamou minha atenção. Esse texto diz que Deus não desampara a nenhum daqueles que conhecem o seu nome e confiam nele. É importante notar que, como cristãos, acreditamos em toda a dimensão desta Escritura. O que quero dizer com isso é: cremos que de fato Deus jamais desampara e nunca abandona quem o conhece e confia nele. Como posso descrever isso de maneira que qualquer leitor possa entender isto? Deixe-me tentar!
Para um genuíno cristão, a morte e todas as mazelas e problemas da vida não são um problema de fato. Para nós, sofrer um acidente de carro, perder uma pessoa querida, passar pela falência, perder nossos bens, ser furtados ou roubados, ficar paralíticos, doentes ou acamados em um hospital não é fim de nossa vida ou de nossa jornada, cremos que em Deus, a dimensão do sofrimento nos elevará para mais perto dele e aproximará nosso encontro.
Quando os cristãos primitivos morriam nas dez perseguições romanas[5] nos dois primeiros séculos de nossa era, eles não temiam a morte por mais dolorosa, humilhante e violenta que fosse, pois sabiam que ao morrer aqui, estariam imediatamente nos braços do seu Senhor. Essa esperança e fé os faziam enfrentar a morte com coragem e honra. Não é diferente de nós e de nossos dias. Hoje precisamos compreender toda a dimensão de nossa declaração de fé em Deus para não sermos enganados por nós mesmos.
Se um cristão sofrer a morte por um acidente de avião, morrer em acidente de trânsito por causa de terceiros, perder alguém por causa de uma bala perdida, perder sua esposa, marido ou filho(a) numa mesa cirúrgica, morrer por doença terminal, ficar paralítico por acidente vascular cerebral, ter a vida ceifada numa guerra ou por qualquer outro meio moderno de morrer, isso não será um problema, pois confiamos no Senhor.
Isto significa que mesmo que iremos ficar tristes, com raiva, frustrados ou sem motivos para continuar por um tempo, depois nos levantamos em confiança porque conhecemos a Deus e sabemos que ao morrermos passamos para um nível mais pleno e elevado de vida, pois temos a certeza da vida que está por vir. Para nós então, essas questões sobre morte violenta, sofrimento e perdas não são motivos para não crer, e sim para crer em algo melhor no porvir.
Por isso o apóstolo Paulo pode dizer:
“Porque, se vivemos, para o Senhor vivemos; se morremos, para o Senhor morremos.”
Romanos 14.8
E:
“Onde está, ó morte, a tua vitória? Onde está, ó morte, o teu aguilhão?”
1 Coríntios 15.55

Portanto, Nietzsche estava errado[6], o cristianismo não nos enfraquece, ao contrário, nossa fé nos torna mais fortes.

Carlos Carvalho
Teólogo e Pastor Sênior da Comunidade Batista Bíblica Internacional
Julho de 2013




[1] Jean-Jacques Rousseau (1712-1778) – A Origem da Desigualdade Entre os Homens. Editora Escala, 2007. Rousseau acreditava que o homem no estado natural era um ser livre, com o coração em paz com o corpo em saúde, mas que não era nem bom nem mau, nem com vícios nem virtudes, sem relação moral nem de deveres (pp.49-50).
[2] Gênesis 6.5,11,12
[3] Forma atual do Deísmo originado pelo Lord Herbert de Cherbury, na primeira metade do século XVII – Enciclpédia Histórico-Teológica da Igreja Cristã – Vida Nova, 1993. Vol 1, p.402.
[4] Judge Dredd, filme de ação norte-americano de 1995, dirigido por Danny Cannon, baseado no personagem de mesmo nome das histórias em quadrinhos de Willian Wisher Jr. E Michael De Luca, interpretado por Sylvester Stallone.
[5] O Livro dos Mártires de John Fox (1517-1587). CPAD, 2002, p. 7ss.
[6] O Anticristo, Friedrich Nietzsche (1844-1900). L&M Pocket, 2009. P.22.

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