CRUZ, SEGUIR E SER
DISCÍPULO
“E qualquer que não levar a sua
cruz, e não vier após mim, não pode ser meu discípulo.”
Lucas 14.27
Estas são as
três expressões mais importantes e contundentes neste versículo. São as imagens
mais cristãs do próprio Cristianismo: a cruz, uma pessoa seguindo Jesus e se
tornando um discípulo dele. Esta é a essência da fé cristã. A fé em Jesus
Cristo está diretamente relacionada com o carregar a cruz pessoal que indica e
demonstra o compromisso da própria vida com ele. Da mesma forma, esta fé é
absorvida pelo seguidor e entranhada em seu ser a ponto de sua caminhada diária
ser drasticamente afetada por isso. E por fim, o seguir a Jesus e carregar a
cruz-compromisso, leva este indivíduo a se reconhecer e ser reconhecido como um
discípulo de Jesus.
O contexto no
qual está esta fala é bem plural. Nele a tríplice expressão
cruz-seguir-discípulo está relacionada com outras três coisas. Fala da
construção de uma torre, de um Estado em guerra e do sal. Jesus nos diz que a
fé comprometida com ele é como quando alguém começa a construir algo e precisa
ter a certeza que terá os recursos necessários para terminá-la, sob a pena de
ser envergonhado se não completa-la. Igualmente, isto está conectado a um
Estado que pretende ir à guerra, mas antes precisa ter a certeza de que seu
exército é poderoso o suficiente para enfrentar seu oponente, senão deverá
mandar proposta de paz. E ao final, estar comprometido com Jesus é ser como o
sal que mantém a sua propriedade e seu sabor, pois do contrário será jogado
fora.
Jesus encerra
sua fala com a famosa e desconcertante frase: “Quem tem ouvidos para ouvir,
ouça”. Isto porque as expressões que ele utiliza para tratar de um assunto tão
sério e difícil de digerir são igualmente reveladoras e graves. Carregar a cruz
pessoal, seguir Jesus independente de qualquer coisa e tornar-se seu discípulo
é uma questão tão séria, profunda e de difícil aceitação para aqueles que não
estão dispostos a viver a vida desta forma, que é necessário levar em conta o
preço envolvido nesta decisão. Ser envergonhado por não conseguir terminar o
que começou por falta de sabedoria e recursos, ser obrigado a rever sua decisão
por perceber que não conseguirá suportar a pressão e a “guerra” que envolve
andar com Jesus e ser rejeitado ao final por não ter mantido a essência de sua
fé e não ter sido fiel é imensamente grave. Eternamente grave.
O Cristianismo
foi vituperado, envergonhado e manchado por causa daqueles que não
compreenderam a dimensão da responsabilidade que ele representa. A verdade da
Palavra de Deus foi diluída nas filosofias de vida, nas expressões de
autoajuda, de “verdades” alternativas, dos conceitos pós-modernistas e de uma
teologia fraca e desejosa de ser aceita por todos. A fé em Cristo foi
enfraquecida por vidas corrompidas, por uma liderança oportunista e gente não
preparada, por ministros profissionais, por pecadores e imorais na pele de
ovelhas e por alguns que rejeitam o sobrenatural de Deus porque desejam alterar
a realidade do julgamento do Senhor contra eles. Mas como afirmou o apóstolo
Paulo:
2
E bem sabemos que o juízo de Deus é segundo a verdade sobre os que tais
coisas fazem.
3
E tu, ó homem, que julgas os que fazem tais coisas, cuidas que,
fazendo-as tu, escaparás ao juízo de Deus?
4
Ou desprezas tu as riquezas da sua benignidade, e paciência e
longanimidade, ignorando que a benignidade de Deus te leva ao arrependimento?
5
Mas, segundo a tua dureza e teu coração impenitente, entesouras ira para
ti no dia da ira e da manifestação do juízo de Deus;
6
O qual recompensará cada um segundo as suas obras; a saber:
7
A vida eterna aos que, com perseverança em fazer bem, procuram glória, honra
e incorrupção;
8
Mas a indignação e a ira aos que são contenciosos, desobedientes à
verdade e obedientes à iniqüidade;
9
Tribulação e angústia sobre toda a alma do homem que faz o mal;
primeiramente do judeu e também do grego;
10
Glória, porém, e honra e paz a qualquer que pratica o bem; primeiramente
ao judeu e também ao grego;
11
Porque, para com Deus, não há acepção de pessoas.
Romanos 2.2-11
Já ouvi muitas
vezes de líderes de várias denominações que quando falamos muito enfaticamente
sobre essas coisas é porque temos algo a esconder, porque queremos afastar os
olhares dos outros dos nossos pecados e coisas semelhantes. Estes homens e
mulheres somente deixam passar uma importante questão: só quem já caiu em
desgraça, quem já foi envergonhado ou teve sua arrogância julgada por Deus é
quem sabe a real potência da destruição que uma vida fraca, uma liderança
corrompida e uma verdade diluída podem causar no reino, na igreja, na família e
na própria vida. Portanto, é preciso falar sobre estas coisas a qualquer tempo
para que a próxima geração de cristãos viva uma vida mais plena na presença de
Cristo no meio de um mundo que se esfacela e se destrói no pecado a cada dia
que passa.
Outros nos
interpelam dizendo que este tipo de mensagem é dura, não atrai ouvintes e não
dá crescimento à igreja nos dias de hoje. Estou tentado a concordar com estes,
mas quem nos disse que o Evangelho ganharia os corações dos homens e mulheres do
mundo todo? Quem nos informou que ter uma multidão em nossos cultos é sinal que
Deus está presente lá? Embora acredite sinceramente que existiram e existem
lugares que Deus abençoa grandemente com multidões que não temos explicações naturais
para isso (e a maioria dos pastores querem que suas igrejas cresçam), os
números jamais foram os indicadores da bênção do Senhor.
É preciso um
equilíbrio no entendimento. Nas Escrituras encontramos Deus guiando multidões
no Antigo e no Novo Testamento, mas também vemos Deus agindo e se importando
com poucos e mesmo com um ou dois. Tudo isto é para nos dar equidade, pois
nosso Deus é o Deus do mundo, das multidões, mas de um também! Voltando ao
nosso texto, termino dizendo que cada um de nós precisa procurar compreender a
dimensão do preço que está sendo exigido por Jesus no caminhar com ele. É certo
que alguns acharão o preço muito alto, mas ele não está disposto a fazer
concessões por causa de ninguém e o risco de apostar numa possível mudança de pensamento
do Senhor por causa de seu “amor” é elevadíssimo e com resultados eternamente
indesejáveis.
Após Jesus ter
ensinado aos muitos discípulos iniciais que andavam com ele sobre sua carne e
seu sangue intimamente ligados ao compromisso de servi-lo em João 6: 41-68, um
grupo grande deixou de acompanhá-lo por considerar o discurso muito duro. Lucas
nos informa que a princípio Jesus tinha setenta discípulos (Lc 10.1), se estes
ainda estavam com ele em João 6, então, 58 o deixaram, restando apenas 12. O Senhor
não se irrita com eles e ainda faz aos doze a pergunta se eles também não
desejavam fazer o mesmo, com a famosa resposta de Pedro de que eles não tinham
intenção de deixá-lo, pois reconheciam que somente ele era a resposta para os
seus mais profundos anseios (João 6.68-69).
A
pergunta continua a mesma para mim e para você: “Quereis vós também
retirar-vos?” (João 6.67). O preço é bem alto, mas a recompensa vale o custo!
© Carlos Carvalho
Teólogo, graduando em Ciências
Sociais e Pr. Sênior da Comunidade Batista Bíblica