quinta-feira, 19 de junho de 2014

O Corpus Christi de Urbano IV

Quero me referir apenas de forma sintética a essas duas coisas que estão intrinsecamente ligadas entre si: a celebração católica de Corpus Christi e ao papa Urbano IV. Primeiro um pouco sobre esse homem que se tornou papa católico em 29 de agosto de 1261.

Nascido como Jacques Pantaléon, de família humilde, estudou teologia e direito civil em Paris, enviado papal a várias missões diplomáticas pela Europa e Oriente, após a morte de Alexandre IV, foi eleito papa, após três meses vago o trono papal por dissensões internas dos oito cardeais da época.

Ativo, capaz, confiante em si mesmo, como o descrevem biógrafos, menos de um ano de sua eleição, criou catorze novos cardeais, destes, seis eram parentes ou subordinados que ele tinha elegido, sete eram franceses, incluindo seu próprio sobrinho. Possuía astúcia diplomática com predileção pela repressão, sabia como criar confusão em seus empreendimentos, provocando dissensões entre cidades rivais. Nunca visitou Roma – a sede do papado era em Lyon, França. Morreu no mesmo mês em que se tornou papa, três anos depois em 1264.

Urbano IV se relaciona com a celebração antes mesmo de tornar-se papa, quando clérigo de Liège, na Bélgica. Lá, ele analisou o conteúdo das revelações de uma jovem do mosteiro agostiniano de Mont Cornillon, chamada Juliana. Ela teve uma visão em que via um disco refulgente branco, semelhante a uma lua cheia, tendo um dos seus lados obscurecido por uma mancha, mas não compreendeu o significado disso.

Segundo se conta, após anos de intensa oração, foi-lhe revelado o significado da “lua incompleta”: ela simbolizava a Liturgia da Igreja, que estava falhando na solenidade em louvor ao “Santíssimo Sacramento” e Juliana foi “escolhida” por Deus para declarar ao mundo o desejo do céu. Após mais alguns anos, teólogos foram consultados – Jacques Pantaléon entre estes, futuro Bispo de Verdum, Patriarca de Jerusalém e futuro Papa – que muito se interessou pelas revelações de Juliana.

No ano de sua morte, chegou a Urbano IV a notícia de que na cidade de Bolsena, durante uma missa na Igreja de Santa Cristina, em que o celebrante, que duvidava da “presença real de Cristo na Eucaristia”, teve a visão em que a hóstia se transformava em um pedaço de carne, que derrama muito sangue sobre corpos. A notícia do “milagre” se espalhou, o papa foi informado dos detalhes e dezoito dias antes de morrer – no mesmo mês de agosto – emitiu uma bula que determinava a celebração da festa de Corpus Christi em toda a Igreja.

A partir daí, essa celebração foi tomando porte e se espalhou pelo mundo católico até se tornar o “centro da vida cristã” católica romana. Como de costume, além de serem celebrações sem fundamentos bíblicos fortes – a não serem vagas citações de textos habilmente ajustados ao contexto desejado – são baseadas em “visões” e “revelações” que não podem ser jamais verificadas e comprovadas, porém com a força da “infalibilidade papal” que lhes confere veracidade, tornam-se dogmas “reais” aos fiéis católicos romanos. Coisas que outrora seriam consideradas heresias, se revestem de “verdades celestiais” pelo poder de homens investidos de uma autoridade que não lhes pertence e a quem o Cristo ressuscitado jamais a outorgou.

Cristãos bíblicos não celebram a festa de Corpus Christi porque, além de não ser uma celebração bíblica, o Corpus de Cristo é a igreja viva e dela participam todos os que possuem verdadeira fé nele e nas doutrinas neotestamentárias. Paulo escrevendo aos efésios nos deixou bem claro isto:

17 Rogo ao Deus de nosso Senhor Jesus Cristo, o Pai da glória, vos dê um espírito de sabedoria que vos revele o conhecimento dele;
18 que ilumine os olhos do vosso coração, para que compreendais a que esperança fostes chamados, quão rica e gloriosa é a herança que ele reserva aos santos,
19 e qual a suprema grandeza de seu poder para conosco, que abraçamos a fé. É o mesmo poder extraordinário que
20 ele manifestou na pessoa de Cristo, ressuscitando-o dos mortos e fazendo-o sentar à sua direita no céu,
21 acima de todo principado, potestade, virtude, dominação e de todo nome que possa haver neste mundo como no futuro.
22 E sujeitou a seus pés todas as coisas, e o constituiu chefe supremo da Igreja,
23 que é o seu corpo, o receptáculo daquele que enche todas as coisas sob todos os aspectos.
Efésios 1:17-23 (Versão Católica, grifo nosso)

Esquecem-se os teólogos católicos que quando o Senhor celebrou a Santa Ceia e disse aos discípulos “isto é o meu corpo” e “isto é o meu sangue dado por vós”, dois simples entendimentos não poderiam ser deixados de lado:

O primeiro – é que o sacrifício do corpo e do sangue do Senhor fazia referência aos sacrifícios anteriores exigidos pela lei para a purificação e perdão de pecados cometidos pelos homens contra Deus. Os sacrifícios instituídos eram insuficientes para de fato libertar o homem do jugo do pecado (Hebreus 10.1-18), por isso um sacrifício perfeito foi gerado por Deus em Cristo Jesus. Portanto “corpo e sangue” falam da oferta de Cristo para gerar a mudança da Aliança entre Deus e os homens.

O segundo – e mais simples ainda é que quando o Senhor Jesus disse as palavras “meu corpo e meu sangue”, ele ainda estava presente e não havia morrido. É muito óbvio que se trata de um simbolismo poderoso do sacrifício que ainda não havia sido realizado. Como alguém pode dizer que o pão é seu corpo e o vinho é o seu sangue se era ele mesmo quem os estava repartindo ali, a não ser que se trate de um símbolo ou uma referência?

Em nenhum momento das Escrituras do Novo Testamento o Senhor nos disse que estaria presente conosco através do pão e do vinho da Eucaristia, mas disse que estaria conosco “até a consumação dos séculos” (Mateus 28.20) quando, depois de ressuscitar, ordenou aos discípulos que fossem pelo mundo fazendo discípulos, batizando e depois subiu aos céus. Isso não tem nada a ver com a Ceia ou com a Eucaristia, mas sim com a Grande Comissão.

Na Ceia (Eucaristia para os católicos), o Senhor com todas as palavras – mais claras impossível – disse que deveríamos celebrar a Ceia “em memória de mim” (Lucas 22.19; 1 Coríntios 11.23-26) e não que aqueles elementos se “transformavam” em partes vivas de si mesmo, pois a própria Escritura não pode se contradizer com o texto já referido aos efésios onde o “corpo” do Senhor é a igreja dele. Talvez seja muito fácil para teólogos não comprometidos com a verdade bíblica manipular textos à sua vontade para se adequar aos seus interesses – coisa comum nas religiões, seitas e até mesmo entre os “evangélicos” – mas a Palavra de Deus não se curva a homens.

Sola Scriptura

C. K. Carvalho
Teólogo

Referências

Disponível em: http://ec.aciprensa.com/wiki/Papa_Urbano_IV#.U6Lk-JRdX3Q. Acessado em 19/06/2014

Disponível em: http://www.dec.ufcg.edu.br/biografias/PPUrban4.html. Acessado em 19/06/2014

Disponível em: http://www.daemon.com.br/wiki/index.php?title=Papa_Urbano_IV. Acessado em 19/06/2014

Disponível em: http://maradentro.com.br/amor-eucaristico-origem-da-festa-de-corpus-christi.html. Acessado em 19/06/2014

Disponível em: http://maradentro.com.br/amor-eucaristico-origem-da-festa-de-corpus-christi.html#sthash.B8iYtS0P.dpuf. Acessado em 19/06/2014


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