quinta-feira, 19 de fevereiro de 2015

Tensão Tripla - momentos distintos e simultâneos da fé cristã de nossos dias


TENSÃO TRIPLA

Acredito que vivemos três momentos distintos e simultâneos no que diz respeito à fé cristã de nossos dias:

O primeiro é o aspecto superficial, não bíblico, sem referências escriturísticas fundamentadas que permeiam o universo dos crentes de nosso país e também do Ocidente. Vivemos uma verdadeira falsidade ideológica, no sentido restrito dessa expressão, ou seja, usar uma identidade que não é a sua. O mais importante da falsidade ideológica é, para a considerarmos como tal, que a forma do documento seja verdadeira, ao passo que a fraude esteja inserida no seu conteúdo. Em outras palavras, apresenta-se como sendo a expressão da verdade, mas de fato, esconde a realidade da falsificação.

Falsos obreiros, falsas autoridades, gente não vocacionada ocupando espaços sagrados, dissimuladores e falsificadores da Palavra, falsos adoradores e um número enorme de pessoas não libertas das garras dos demônios assumindo a direção de “cultos” de todos os tipos. Gananciosos, interesseiros, vingativos, libertinos, ociosos, perturbadores da paz cristã, caluniadores, negociadores da fé, manipuladores de textos bíblicos para seu lucro pessoal e pseudodetentores da verdade com a capa de “ungidos” apenas por Deus, ou “mandados” somente pelo Espírito Santo sem o aval da verdadeira igreja de Cristo. Um batalhão de crentes que desejam ser o que não são e tampouco foram chamados para ser!

O segundo é o equívoco da maneira de viver o cristianismo. Isso se inicia na interpretação errônea do texto sagrado, fazendo-o declarar inverdades, e, no “melhor” das hipóteses dar ênfases contraditórias ou meias verdades que não trazem real transformação de vida nem mudança de atitudes dos crentes em relação à moral, à ética e ao comportamento diário. Assim se gera um exército de gente que se tornam verdadeiros poços de iniquidade, de palavras torpes, de falsas verdades, de comportamento dúbio, sem conversão, sem arrependimento e sem Cristo ao final.

A coisa se aprofunda e o campo de Deus se torna um reduto de joios, de virgens não preparadas (segundo a parábola de Jesus), de gente permissiva e sensual, de apóstatas e lobos em pele de cordeiros, gente para quem as cartas de segunda a Pedro e Judas foram escritas e que vivem sorrateiramente em nosso meio como se fossem salvos, mas não há para estes nenhuma esperança de redenção, e como parece que sabem disso, desejam contaminar o máximo possível de cristãos neófitos e confusos e levá-los consigo para a sua perdição.

O terceiro momento simultâneo é a da completa falta de compreensão da vocação e eleição cristã que pode nos fazer ir ao extremo de perder a própria vida por amor a Cristo. No Ocidente não vivemos uma perseguição declarada aos cristãos, ao menos ainda. Há uma intolerância velada contra nós na mídia, nas lutas de minorias que desejam seus “direitos” em detrimento à revelação bíblica e no ambiente da educação onde não se permite de maneira pontual uma defesa da fé cristã e do criacionismo, mas em linhas gerais, uma perseguição geral e feroz ainda não é uma possibilidade em curto prazo. Isso torna os cristãos ocidentais uma espécie de anestesiados em relação ao que acontece no mundo oriental e em lugares de regimes absolutistas.

A exemplo disso, a morte de cristãos no mundo chega à casa dos 10.000 por ano, somente nos casos documentados e isso é uma pequena parcela da realidade global. Parece que isso só nos choca por um momento e depois seguimos com a vida repleta de facilidades e prazer, e apenas algumas ações pontuais são realizadas por certos grupos de cristãos atuantes em direção a esses graves problemas com alguns clamores de oração por eles. Não participamos das dores de nossos irmãos e irmãs mais efetivamente. Isto não é um chamado a uma cruzada armada em defesa deles, mas um clamor por uma ação fortemente mais concreta até mesmo na construção e manutenção de “cidades de refúgio” por parte da igreja mundial em países tolerantes à nossa fé. Precisa ser uma ação global, incisiva e não armada.

Tudo isso sem mencionar nossa apatia às demandas de justiça social e carências profundas nas quais vivem o próprio povo das nações onde os cristãos habitam. Um Evangelho total para o ser humano passa necessariamente por esforçadas ações humanitárias e solidárias que já há muito nos foram ensinadas pelo Senhor Jesus na parábola do samaritano. Sabemos que o mundo (as pessoas que nele habitam) não se torna melhor com o passar do tempo, mas a igreja de Cristo não pode deixar de comunicar a mensagem do Senhor e tampouco não agir como Ele agiria se estivesse pessoalmente aqui.

Jesus sabia que o mundo inteiro não seria transformado por sua mensagem, mas também sabia que bilhões seguiriam sua vida e ensinos. Talvez não consigamos mudar de fato o mundo, mas não devemos deixar de acreditar que sua mensagem é a resposta para a raça humana caída e sujeita ao pecado que a destrói continuamente. Agir como Jesus é amar o mundo como Ele amou e morreu por isso, é ser agente de transformação e reconciliação como Ele foi e foi rejeitado por muitos, é ser pacífico e pacificador como Ele foi, mesmo quando desejam tirar a nossa vida como estão fazendo em alguns países.

Vivemos a tensão tripla entre a falsidade ideológica cristã, a práxis da vida cristã e a compreensão da vocação cristã, e isto em um ambiente nacional e global de tremendas demandas e necessidades sociais. Tenho dito que não é preciso apenas um retorno à fé reformada, mas um retorno à fé de Cristo, dos apóstolos do Cordeiro e dos primeiros discípulos para se criar um novo momento de transformação que o mundo precisa. Ou isso, ou o retorno de Cristo ao mundo!



© Carlos Carvalho
Teólogo e Cientista Social
Comunidade Batista Bíblica
Seminário Teológico Batista Independente de São Paulo

Universidade Metodista de São Paulo

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